segunda-feira, 31 de outubro de 2011

ENTREVISTA - SILVINO NETO

Foto: Arquivo CEDES
SILVINO NETO*

"O Estado de Pernambuco não tem um Sistema de Garantia de Direitos pensado em direitos humanos."

Nesta entrevista, Silvino Neto fala sobre as políticas voltadas para a criança e o adolescente e uma verdadeira efetivação dos direitos garantidos no ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente, Conselhos de Direitos e Conselho Tutelar, Rede de Atendimento, redução da maioridade penal, tão discutida atualmente, além da articulação da sociedade civil, através do Fórum Estadual DCA na promoção e defesa dos direitos da criança e do adolescente.

Blog do CEDES – O que o senhor acha das políticas voltadas para a criança e o adolescente em Pernambuco?

Silvino Neto - O Estado de Pernambuco não tem um Sistema de Garantia de Direitos pensado em direitos humanos. Avançaram-se as políticas de forma geral, melhoramos o acesso a escola pública, diminuímos a mortalidade infantil, mas temos dívidas imensas como  a falta de um Plano Estadual/Municipais de Convivência Familiar e Comunitária, a falta de implantação de medidas de LA e PSC nos Municípios e o desrespeito para com os adolescentes internados são exemplos. Aliás, a política de atendimento para adolescentes em medida sócio educativa de internação é a mesma desde o Código de Menores – FEBEM, FUNDAC e FUNASE, são a mesma coisa.


Blog do CEDES – O que deve ser feito para que ocorra uma verdadeira efetivação dos direitos das crianças e adolescentes em nosso Estado?

Silvino Neto - O Orçamento Criança do Estado de Pernambuco para investimento e melhoria em ações é ridículo. Igualmente, perdem-se muitos recursos pela falta da intersetoriarialidade na execução dos serviços. Perdemos tempo e recursos com pactos e pactos não executados. O maior exemplo é o Plano Estadual de Enfrentamento a Violência sexual contra Crianças e Adolescentes que tem uma execução irrisória.

Blog do CEDES – Em relação aos Conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e os Conselhos Tutelares, como garantir uma melhor atuação por parte desses órgãos na promoção e defesa dos direitos da criança e do adolescente?

Silvino Neto - Nós precisamos entender que tamanho tem os Conselhos de Direitos e Tutelares. Vinte e um ano após a promulgação do ECA temos observado que os defensores do Estatuto da Criança e do Adolescente, os próprios conselheiros de direitos começam a perder a coragem em exaltar o papel deliberativo, controlador das ações e formulador de políticas deste órgão. Em alguns Estados e Municípios eles precisam consultar a primeira dama, o secretário tal e qual... Deliberam o micro e fogem do macro e se perdem em questões como diriam alguns colegas “não republicanos.”
Quanto ao Conselho Tutelar, órgão fortíssimo, acreditamos que passou da fase de estruturação político/pedagógica para afirmação. Pela força legal que carregam, com o passar do tempo atingirão a maturidade e aí não precisarão sair de jaqueta preta, assustando crianças e adolescentes. Precisam, entretanto, superar um problema que atinge negativamente o órgão, que é a interferência político/partidária, de péssima qualidade no momento da eleição. Este problema tem trazido para dentro dos Conselhos Tutelares conselheiros/as sem compromisso com a causa e distantes da criança e do adolescente. Os Conselhos Tutelares não podem extrapolar as atribuições previstas no ECA,  no artigo 136 . A resolução 139 do CONANDA (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) precisou ratificar o artigo por causa da interferência de outros órgãos no Conselho Tutelar. “Art. 24. O Conselho Tutelar exercerá exclusivamente as atribuições previstas no artigo 136 na Lei nº 8.069, de 1990, não podendo ser criadas novas atribuições por ato de quaisquer outras autoridades do Poder Judiciário, Ministério Público, do Poder Legislativo ou do Poder Executivo municipal, estadual ou distrital”.
Finalmente, você não pode ter um órgão com a competência do Conselho Tutelar e ao mesmo tempo falar de “eventual remuneração“ como os legisladores do ECA definiram. Há que se pensar a remuneração do/as Conselheiro/as, relacionando-a a competência e as atribuições do órgão.


Blog do CEDES – Muito se fala sobre o trabalho em rede do sistema de garantia dos direitos. Em sua opinião, o que deve ser feito para a implementação dessa rede de atendimento à criança e ao adolescente?

Silvino Neto - Um grande problema é que os operadores de direitos não gostam de trabalhar em rede. Tem muita gente querendo ser o dono da rede; outros querem todos pensando de forma igual, não admitem discordâncias.  Exemplo: Mesmo que o Estatuto defina o Conselho de Direitos como “controlador das ações em todos os níveis”, observamos muitos querendo exercer este controle. O modelo menorista do Código de Menores em algumas cidades está vivo e atuante. Na Escola de Conselhos, tenho ouvido da ação de alguns Conselhos de Direitos, juízes e promotores que se inquietam com autonomia do Conselho Tutelar e que, em todo momento insistem em criar novas atribuições ao Conselho Tutelar ou tentam colocá-lo como órgão subordinado. Não é fácil encontrar Magistrados semelhantes ao Desembargador Luiz Carlos de Barros Figueiredo, ou Juízes como Humberto Vasconcellos ou Élio Brás, não é fácil encontrar procuradores iguais a Romero Andrade, Francisco Sales e promotoras semelhantes à Janeide Oliveira, Francisco Rosa, entre outros/as.

Blog do CEDES – Muitas pessoas do poder público e da sociedade em geral, defende que haja a redução da maioridade penal no Brasil, o que o senhor acha desta questão?

Silvino Neto - São ridículos. Defendem para o outro o que não querem para seus filhos. Na maioria das vezes sequer conhecem a Lei. O que precisamos é ter municípios com medidas de LA e PSC com programa de ação continuada e em 21 anos de ECA isso ainda não aconteceu. Mas, na prática a redução da maioridade já aconteceu. Algumas Unidades de Internação conseguem ser bem mais rude que os presídios para adultos. Excetuando-se o CASE- Jaboatão dos Guararapes que luta com insistência para não fugir do que é o SINASE.

Blog do CEDES – Neste ano estão ocorrendo as Conferências Municipais e a Estadual dos direitos da Criança e do Adolescente. Porque é tão difícil implementar a política, através das propostas elaboradas e aprovadas nas respectivas conferências?

Silvino Neto - O município de Quixaba fez isso priorizando educação. Hoje tem uma escola pública que é destaque em todo o Brasil.
Precisamos superar alguns problemas como:
1-Muitas vezes não sabemos o que vamos implementar;
2- Não existe recursos no orçamento para implementação;
3- Alguns gestores, muitos na área da infância, não colocam criança como prioridade absoluta;
4- Não é por acaso que o Plano Decenal de Direitos Humanos de Crianças e adolescentes vai começar com atraso;
5- Adiaram a Conferencia Nacional sem consultar os Municípios;
6- O CEDCA- PE  acabou com as Conferencias Regionais também sem consultar os Conselhos Municipais , Fórum DCA, etc.
7- Precisamos convencer os empresários para que doem aos Fundos Estaduais e Municipais sem que necessariamente cheguem por verbas carimbadas. Também precisamos fazer com que o governo do Estado e dos Municípios mostrem esta prioridade no orçamento. Precisamos trabalhar estas mudanças com muita responsabilidade e profissionalismo, pois, as últimas campanhas beiraram ao fracasso.
Acredito que, se nos próximos anos conseguirmos implantar o tripé: MOBILIZAR, IMPLEMENTAR, MONITORAR,  teremos como contar vitórias.


Blog do CEDES – O senhor faz parte da atual Coordenação do Fórum Estadual DCA, que em 2011, completou 25 anos, tendo iniciado como Frente Estadual de Entidades Sociais Não-Governamentais. Quais os avanços e as dificuldades desse espaço de articulação da sociedade civil organizada para a garantia dos direitos da criança e do adolescente?

Silvino Neto - O Fórum de Pernambuco é uma articulação de promoção e defesa de direitos humanos de crianças e adolescentes. No seu início conseguiu se destacar por lutar por mudanças, concretizadas em lei pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Depois de um tempo se adaptando a um novo momento onde a sociedade civil sai da articulação e passa a exercer um papel deliberativo dentro dos Conselhos de Direitos, o Fórum se perdeu. Nestes anos mais recentes busca reencontrar o seu papel de articular e propor ações e pautar temas de debates. Vale-se destacar que o Fórum Estadual DCA é composto por Instituições e tenta incentivar a criação de Fóruns nos Municípios. Precisamos exercer o nosso papel de mobilização e monitoramento. Como não vivemos dependentes de recursos de governos, preservamos nossa independência e autonomia. Acreditamos que voltar a atingir todo o Estado é o maior desafio.

*Biólogo, Consultor, especialista em Controle e Gestão de Políticas Públicas para a  infância e adolescência, Ex-Presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente e do Conselho Estadual de Assistência Social de Pernambuco. Atualmente faz parte da Coordenação do Fórum Estadual DCA/PE e Presidente da CEO - Cidade Evangélica dos Órfãos.

Um comentário:

  1. Parabéns Silvuno pela sua tão nobre resposta a esse estado, que tanto se diz criar politicas de melhorias. Não precisamos criar mais novas politicas e sim executar o que esta no papel, fazer valer o que nos lutamos e conseguimos em nosso protestos, também não mais criar novos programas e secretarias fazer valer direitos humanos.

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